Estou lendo “Um Dia”, best seller do inglês David Nicholls. E esse simpático livrinho de amor me deu vontade de escrever sobre a morte.
Provavelmente não seguiria em frente se ontem não fossem noticiadas três mortes que me chamaram a atenção.
_ O Filho do Governador Alckmin, muito jovem, que morreu num acidente de helicóptero
_ Ricardo Della Rosa, um diretor de fotografia brasileiro brilhante e admirado por todos, levado pelo câncer aos 41 anos.
– Manoel de Oliveira, cineasta português que faleceu aos 106 anos de idade (isso mesmo, 106).
Até que um analista prove o contrário, a morte não é uma preocupação que me ataca em especial, não há ninguém em minha família doente ou que inspire maiores preocupações. Foi realmente a soma dessas situações que acabou me despertando para o tema.
Pensando nos mortos de ontem, dois provocaram imensa comoção. Eram jovens, se esperava que fizessem muito, que aproveitassem da vida mais do que aproveitaram. Eles perderam anos em potencial e as pessoas que os conheciam ficaram sem o prazer de seu convívio. No caso do Della Rosa, o mundo perdeu imagens maravilhas que ele certamente faria.
Quando falamos porém do Manoel Oliveira, a dor é menor. Por mais que isso pareça insensível, era de se esperar que ele partisse e não há como dizer que o tempo que tinha para criar, fazer o que gosta ou conviver com quem amava tenha sido pouco.
Mesmo assim, sua família e os mais próximos devem ter sofrido. Quem está preparado para morte? Quem pode aceitá-la com serenidade?
No livro de David Nicholls, que inspirou essa crônica, o personagem Dexter pensava justamente isso, não estar preparado para a grave doença da mãe:
“…Sempre imaginou que aos quarenta e cinco ou talvez cinquenta anos ele teria algum tipo de equipamento mental que o ajudasse a lidar com a iminente morte de um dos pais, se ao menos tivesse esse equipamento, estaria tudo bem. Poderia se mostrar nobre e altruísta, sábio e filosófico. Talvez pudesse ter seus próprios filhos, usufruindo assim da maturidade que vem junto com a paternidade, a compreensão da vida como um processo.”
Mas ele não tem quarenta e cinco anos, tem vinte e oito. E a mãe tem quarenta e nove. Houve um terrível engano. A sincronia não funcionou, e como ele poderia lidar com isso, a visão extraordinária da mãe minguando daquele jeito?…”
Caro Dexter, se você tivesse filhos e os tais quarenta e cinco anos, nada adiantaria, somos sempre crianças diante da morte.
Creio que até o moribundo seja mais preparado para enfrentar a própria sina do que os que ficam.
No Brasil poucos conheciam Levon Helm, vocalista e baterista do “The Band”. Ele morreu de câncer em 2012. Em 2011 ele fez uma pequena apresentação ao lado de amigos num evento. É interessante ver no vídeo ele tocando banjo, muito rouco e numa magreza assustadora. Enquanto seus companheiros fazem força para conter as lágrimas, Levon está muito feliz, soltando o pouco da voz que sobrou, aproveitando o momento. Enquanto todos olham para ele e pensam na morte, Levon curte o que lhe resta da vida.
Agradeço a Levon Helm pela pequena lição. Vamos aproveitar o que temos, curtir o momento, ficar próximos daqueles que nos fazem bem. Afinal, jamais saberemos se vamos comemorar os cem anos, como fez Manoel de Oliveira, ou se sucumbiremos de repente, como infelizmente acontece com tantos.
Para quem se interessar, o vídeo de que falei: