Que ódio

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Já experimentou falar com os dentes cerrados? Tente. Veja que falando assim parecemos vilões de novela. Ainda mais se a frase for agressiva. Faça um teste com a clássica fala de folhetim televisivo: “Vou acabar com aquela vigaristazinha de subúrbio”. Você perceberá que ficou uma perfeita Carminha ou uma Odette Roitman (para os mais velhos).

Não usamos esse tom de voz no nosso cotidiano. Em geral ele é reservado para brigas especiais como naquela hora em que seu gato aparece com um rato morto na cozinha ou o maridão com batom brega na cueca. Se você fala com os dentes cerrados todos dias, recomendo enfaticamente que busque um psicólogo (e um dentista).

Só que em nossas queridas redes sociais (e não só nelas) a fala com dentes cerrados e caixa alta virou regra.

O que fez com que o pacato brasileiro, aquele a quem Sério Buarque de Holanda chamava cordial, ficasse assim? É um tal de xingar a invejosa, de responder ao Palmeirense, de atacar a opinião do outro, de bloquear o velho amigo…

Ou as pessoas estão com a paciência no nível “Michael Douglas em Dia de Fúria” ou a cordialidade e a passividade tupiniquins não passam de uma lenda.

Acho que as duas explicações tem um punhado de verdade.

Depois de 500 anos sendo mal tratados pelos sujeitos que usam carro oficial, depois de aguentar desmandos e incompetência que vão desde o palácio presidencial até a atendente do posto de saúde, o brasileiro perdeu o bom humor.

Agora piadinhas sobre a situação não bastam, sofrer o ano inteiro para se divertir no carnaval não é suficiente e, portanto, nossos amigos dos gabinetes precisam começar a caprichar, caso contrário (e isso já está acontecendo), enfrentarão uma população com a faca entre os dentes.

Por outro lado, a história do brasileiro cordial, passivo, povo que caminha bovinamente para seu destino infeliz não é (e nunca foi) real. A história do Brasil é feita de revoltas e muito sangue. Guerras regionais, levantes e cangaços mostram que nosso povo tem sim o seu limite.

Agora me pergunto onde o ódio vai nos levar? Vejo petistas torcendo para a água acabar de vez e assim prejudicar o Alckimin. Vejo Tucanos torcendo para a economia do Brasil se escangalhar para que o PT afunde no lodo.

Eu não gosto dessa ideia. Penso que os políticos vem e vão e por pior que sejam quero continuar pagando minhas contas e tomando banho de chuveiro.

Penso também que no fundo, o que todos querem é um sociedade com mais oportunidades, respeito, segurança, saúde e aquela coisa toda que os políticos nos prometem nas propagandas de TV. Penso que todos concordam que o funcionário público, seja ele atendente do balcão da prefeitura, policial, juiz ou senador, trabalha para nos servir e para isso não precisa de carros especiais ou mordomias.

Em outras palavras, quem joga tachinhas na ciclofaixa não vai prejudicar o Haddad, mas pode machucar uma criança. Quem põe fogo na Banca de jornais não vai derrubar o Beto Richa, mas vai acabar com o sustento de um jornaleiro.

Nós brasileiros, que andamos bradando uns contra os outros cada vez mais, deveríamos tentar encontrar o verdadeiro motivo de nossas indignações e soluções positivas para os nossos problemas.

Dentes cerrados são importantes e inevitáveis nos dias de hoje. Mas se apertar demais é capaz de termos dentes quebrados e nada ganharemos com isso.

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