Daquelas coincidências difíceis de acreditar. A prova do ENEM, elaborada há meses, colocou a Violência Contra a Mulher como tema da redação e a prova caiu justamente na mesma semana em que homens adultos assediaram uma menina de 12 anos no Twitter, durante sua participação num programa de TV.
Claro que os dois fatos juntos aqueceram a discussão sobre o tema e o mais estranho de tudo, criaram polêmica.
Digo que é estranho porque não vejo nenhuma polêmica no assunto. Violência e assédio contra a mulher são ilegais, imorais, abomináveis e inaceitáveis. Mas ao que parece há quem não pense assim. Tanto que muitas mulheres, mostraram o tamanho do problema usando as redes sociais para descrever como foram sexualmente assediadas na infância.
Até aqui, nada de novidade. O que eu quero acrescentar é que se homens agem assim (na melhor das hipóteses como insensíveis ao sofrimento feminino e na pior, como tarados ou molestadores) é porque a educação deles contribuiu para isso. Não a educação formal, mas a ausência dela, somada ao que se aprende nas ruas.
Aliás, nem falemos em eles e sim em nós. Vejamos os fatos:
- Entre nós, os meninos, assim que chega a puberdade, falar de sexo é a coisa mais comum do mundo.
- Garotos dos anos 80, longe da facilidade da internet, recorríamos a revistas pornográficas facilmente encontradas em bancas de jornal para começar a aprender sobre o assunto. Imagine a facilidade para os garotos de hoje. No mundo da pornografia, o papel da mulher é sempre de ser inferior que existe para dar prazer ao homem.
- Alguns recorriam a prostitutas muito cedo, aos 13 ou 14 anos, em muitos casos com o apoio e incentivo do pai. Assustador? Pode ser, mas nas nossas conversas no pátio da escola, isso era assunto corriqueiro.
- Havia uma certa hierarquia entre os garotos. Quem sabe um pouco mais, quem já beijou ou quem já transou é o melhor e mais admirável.
- A hierarquia continua existindo por toda a adolescência até a idade adulta. Se alguém sai com várias mulheres, transa com todas e conta para os amigos sua aventuras sexuais, esse alguém se impõe como o macho alpha. Ele é o admirável, ao contrário de quem é tímido ou simplesmente não consegue o mesmo desempenho, que vai sofrer não apenas com a solidão mas com o fato de ser visto como inferior pelo grupo. E esses são a maioria dos garotos.
- Garotos que “pegavam” várias mulheres eram heróis. Garotas que saiam com vários garotos eram vistas como vagabundas. (odeio o verbo pegar, mas aqui veio a calhar).
- A relação com as meninas tinha a ver com satisfação dos desejos; realização do ego; posição social e poder. Não se fala em afetividade, troca de experiências ou respeito. (Curiosamente, é bem comum ver homens de sucesso ao lado de mulheres fisicamente maravilhosas, às vezes muito mais jovens, que justamente oferecem a eles: satisfação dos desejos; realização do ego; posição social e poder).
Resumindo, não me espanta ver tantos homens adultos agindo como desequilibrados se desde sempre seu desejo e afetividade são colocados no âmbito da competição e hierarquia social.
Se queremos adultos mais saudáveis, precisamos começar com a educação de meninos e meninas, de forma transparente e madura. Que trate de sexo e afetividade, que mostre as relações baseadas em respeito e troca.
Dentro da minha visão de leigo, o machismo vem da crença de que o homem possui um papel desigual ao da mulher na sociedade. Isso provoca diferença de salários, de oportunidades e de posição. A violência e o assédio são frutos de um desequilíbrio psicológico ou comportamental. Ambos são graves e precisam ser combatidos, mas o primeiro é um mal social, o segundo, um mal, individual que ataca milhões de homens.
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