Lola irritava-se – “Que mania as pessoas tem de falar de séries de TV!”.
Lola trabalhava muito, chegava em casa cansada e tinha que dar atenção ao filho, ao marido, ao cachorro, cuidar de seus afazeres, ligar para a mãe… Nunca teria tempo para assistir uma novela americana sobre zumbis.
O problema é que quando conseguiam marcar um cervejinha no bar ou um jantar no apartamento de amigos esse era o assunto predileto.
“Eu acho que o House morre no final.”
“Eu sou apaixonada pelo Draper.”
“Essa sexta temporada não está tão boa. O Jake perdeu a graça.”
” Não me conta nada que eu perdi o último episódio.”
E lá ficava Lola calada e cabreira de não lembrar de um personagem desde a Rachel de Friends nos anos 90.
Até que um dia Lola se separou. O filho passou a ficar ora lá, ora cá e o cachorro, traidor, escolhera o ex-marido.
Assim, sem que houvesse pedido, Lola ganhou um bem que há anos perdera, o tempo. Passou a ter algumas noites por semana que pertenceriam apenas a ela. Então presenteou-se com o direito de assistir às séries de TV de que tanto ouvira falar.
Assinou o Netflix e começou com Narcos, já que sempre ficara em silêncio enquanto os amigos elogiavam a atuação do Wagner Moura. Gostou tanto do primeiro episódio que assistiu seis em sequência. Na manhã seguinte chegou atrasada ao trabalho e passou o dia inteiro com sono.
Depois disso a situação piorou. Bastava começar qualquer série que sentia uma angustia imensa que só se resolvia no último episódio. Perdia madrugadas, se irritava quando o filho demorava a dormir. Começou a ter problemas gerados pela falta de atenção no trabalho, passava o dia ansiosa pelo destino de Walter White ou de Frank Underwood. Chegou a ver um episódio inteiro de Demolidor escondida dentro do banheiro do escritório.
E isso tudo não a ajudou nas conversas com as amigas em bar. Isso porque não havia tempo de ir a bares ou ver as amigas. Ela desmarcava encontros, perdia compromissos, faltava a eventos. Tinha muito o que assistir, eram séries e mais séries.