Confesso que algo me incomoda nos streamings de música. Talvez o excesso de facilidade. Sou do tempo em que quando um disco novo era lançado, tínhamos de juntar dinheiro para comprar um LP ou conseguir uma cópia em fita K7. A ansiedade em não ter o disco e simplesmente não poder ouvir uma única faixa fazia parte do jogo.
Na verdade, sinto pela fita K7 a mesma nostalgia que pelo cheiro de material escolar novo. Se um dia o material escolar for substituído por aplicativos, será o fim de tudo.
Voltando à fita, é triste ver uma arte que se perdeu. Pois copiar os discos era o menos divertido. Nada se comparava ao desafio de fazer coletâneas.
OK, vocês podem fazer “playlists” no Deezer, mas nunca saberão da preocupação de separar as músicas em lado A e lado B. E ainda mais importante, a equação para aproveitar ao máximo um lado da fita e ao mesmo tempo não cortar o final da última música. A angústia de ver o rolo da fita ficando menor e não saber se a última gravação vai acabar num lindo fade ou num corte abrupto.
Gravávamos fitas do rádio. Os botões de rec e pause pressionados, prontos para iniciar uma gravação assim que o primeiro acorde fosse reconhecido. Eram fitas e fitas sem que nenhuma música tivesse um começo decente, mas perdoem-me eu só tinha uns 13 anos.
Só quem viveu aquela época entende o prazer de abrir a embalagem plástica puxando a linguetinha. Poucas invenções humanas eram tão perfeitas. Só quem chupou drops Dulcora lembra de como os botões dos tocas fitas eram duros e deliciosamente mecânicos.
Fitas K7, material escolar novo, cadernos encapados e figurinhas sem o autoadesivo, preciso parar por aqui, antes das lágrimas turvarem minha visão. Aproveito para lançar um desafio para os mais novos:
Qual a relação entre o lápis e a fita K7?
Ahhh adorei. Muito bom. Bem, vc bem sabe da minha fascinação por essas pérolas (ainda tenho muitas e muitas delas).
Lápis e fitas K7 hahahahaha inseparáveis
Os jovens nunca terão esses prazeres!
Muito bom Gold, parabéns por mais essa crônica excelente!
Obrigado por me visitar sempre!
Pois é. Não vou responder a esse seu desafio. Já tenho 67. É covardia. Os aspectos prosaicos, triviais, cotidianos e serenos semearam lirismo e afetividades em quem os vivenciou. E isso, meu caro, isso …
O tempo põe açucar nas lembranças.
Excelente artigo. O saudosismo é realmente saboroso, mas temos a tendência de poetizar o passado… Eu também adorava as fitas K7, mas passei muita raiva com elas, e por isso ainda prefiro o meu serviço de streaming. É claro que o fim da mídia física (LP, CD, fitas, etc.) banalizou muito a nossa relação com a música. Primeiro que hoje tudo fica “velho” em poucos dias, a parte visual dos discos ficou ridiculamente pior, se considerarmos algumas capas de LP (e seus encartes) que eram verdadeiras obras de arte…ainda assim a digitalização democratizou a produção. Não sei dizer se isso é bom ou ruim, mas o fato é que hoje qualquer pessoa consegue produzir e gravar um trabalho musical com excelente qualidade de áudio. É claro que de vez em quando revisito as músicas que eu tinha gravadas em fita, e também me delicio com uma boa dose de saudosismo.
Claro que o streaming é melhor, mas eu precisava de um mote para abrir o texto. rsrss