eco. (Do gr. echó, pelo lat. echo) S.m. 1. Fenômeno físico devido à reflexão de uma onda acústica por um obstáculo, e observado como a repetição de um som emitido por uma fonte. 2. P. ext. Ruído, rumor, som. 3. Repetição de palavras ou de sons. 4. Pessoa ou entidade que repete ou propaga o que é dito por outrem… 9. Lembrança, recordação, memória, vestígio.
Era uma manhã lisboeta cinzenta com cheiro de chuva no ar. Fazia frio, como era de se esperar no final do inverno português de 1682. A fila já ia longa, em direção ao Terreiro do Paço, onde o palco estava preparado de véspera. O grosso dos habitantes se dirigia para mais um auto-de-fé, que prometia sete judeus sefarditas, queimados na fogueira.
O primeiro “auto da fé” registado foi realizado em Paris em 1242, sob o reinado de Luís IX. Já a Inquisição portuguesa, também conhecida como o Tribunal do Santo Ofício, foi estabelecida em 1536 com a autorização do Papa Paulo III.
O rei Dom Pedro II, o Pacífico (quinto e último filho do rei João IV e sua esposa a rainha Luísa de Gusmão), ia numa carruagem revestida de veludo vermelho junto com o cardeal Dom Francisco de Castro. Guardas fortemente armados faziam a escolta. Sua esposa, Maria Francisca de Saboia, que normalmente evitava esse tipo de evento popular, desta feita resolveu acompanhá-los.
Quando chegaram ao seu camarote, toda a população já se distribuía em volta das fogueiras. Nuvens carregadas escureciam o céu. Os condenados, lentos, afinal andavam acorrentados, estavam longe.
As punições pela Inquisição começavam com a obrigação de envergar um sambenito (espécie de capa penitencial com um grande X vermelho cruzando o peito), passavam por ordens de prisão, açoitamentos e, finalmente, em jeito de eufemismo, o condenado era relaxado à justiça secular, isto é, entregue aos carrascos da Coroa.
O Estado procedia às execuções, em consequência da condenação pelo tribunal religioso. Os prisioneiros eram queimados vivos. Contudo, se mostrassem arrependimento e decidissem se reconciliar com o catolicismo, os carrascos procederiam ao “piedoso” ato de os estrangular antes de acenderem a pira de lenha.
Quando a fila de condenados finalmente chegou à frente da praça, o povo, impaciente, começou a gritar, ecoando a histeria coletiva patrocinada pela Coroa portuguesa, pedindo sangue, pedindo chamas, pedindo punição, pedindo culpa.
Um velho em frangalhos, primeiro da fila, blasfemou para a multidão, cuspiu nos religiosos que o seguravam pelas correntes e foi logo amarrado à primeira fogueira.
A multidão enfurecida não queria esperar os próximos, já pedia para esta primeira ser acesa, o céu, cada vez mais escuro, prometia uma chuva que podia acabar com a festa cristã. E todos queriam sangue, fogo, lágrimas.
A fogueira foi acesa e não demorou para as labaredas alcançarem as pernas do velho, que, estoico, não gritou, não chorou, apenas olhava com olhos de ódio para seus algozes, para o rei, para o cardeal, para a rainha e principalmente, para o público.
A fumaça e o cheiro de carne queimada mal começaram a se espalhar quando grossos pingos de chuva começaram a cair do céu.
A fogueira ardia e foi alimentada por uma forte ventania que acompanhou o início da tempestade. O velho finalmente fechou os olhos – o fogo, apesar do aguaceiro, chegava a mais de três metros de altura e finalmente consumiu os trapos, a lenha, as carnes, os ossos.
Muitos correram para se abrigar. A chuva, inclemente, aumentava e os ventos levantavam as batinas dos religiosos que não sabiam o que fazer com os outros seis prisioneiros. Raios e trovões caiam incontroláveis. Parecia literalmente um castigo dos céus.
A peruca do rei ensopara, a roupa do cardeal ficando mais pesada a cada momento, a rainha tentando se proteger com sombrinhas inúteis que suas amas lhe estendiam. Sua cara branca e sua maquiagem borrada.
Interromperam o auto-de-fé. Voltem os prisioneiros para as masmorras, volte o povo para sua vidinha medíocre. Voltou o rei, neste momento nem tão pacífico, para o palácio. Voltou o cardeal para a catedral (um bom vinho do Douro o esperava).
Entre os seis felizardos que escaparam das fogueiras, Sebastião Nogueira foi o único que conseguiu fugir da prisão, dois anos depois. Manco, é verdade. Se estabeleceu cristão-novo em Salvador, primeira capital do Brasil colônia, fundada em 1549.
Da gripe, contraída naquela fatídica manhã do frustrado auto-de-fé, a rainha veio a falecer no ano seguinte.
Em 2017, uma mulher, identificada como Vilma Trujillo García, de 25 anos, morreu em Manágua, capital da Nicarágua após sofrer queimaduras em todo o corpo ao ser amarrada e jogada em uma fogueira em um ritual da igreja Assembleia de Deus.

Entre assustador e inacreditável. Quando você imagina que fomos trogloditas vem o aviso de que esse tempo não passou. Será que somos todos da mesma espécie? Haverá um “tipo” ancestral vivendo e se multiplicando e, aparentemente, se tornando maioria, entre nós? Medo!!
Estava à mercê de minha ignorância, não imaginava, aliás desconhecia por completo esse lado negro da história. Infelizmente o negrume ainda existe, apenas com rituais diferentes em outras crenças e políticas impostas guelas abaixo!😔
Mesmo no Brasil, alguns judeus e cristãos novos foram presos e levados para queimar em fogueiras de Lisboa.
Pedrão, eu jamais me surpreenderia com o seu talento. Mas sou obrigado a exclamar. Que fase! É um melhor que outro!
Valeu, meu caro!